Taguaparque – Padre Bernardo – 18/03/2017

Brasília, 18 de março de 2017

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Quando comecei a pedalar pra valer, por volta dos quinze anos de idade, o tipo de percurso que eu mais fazia era pedalar de uma cidade pra outra. A forma de ocupação do território paranaense facilita esse tipo de atividade, pois as cidades são próximas. Considerando um raio de cinquenta quilômetros da minha Sertanópolis, é possível visitar quase vinte cidades. Já aqui no Centro Oeste, com sua colonização recente, as cidades são mais distantes.

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Os ciclistas de Brasília gostam muito de pedalar até Pirenópolis, algo que parece ter se tornado um vício. Esse assunto foi tratado pelo meu amigo Cristóvão Naud no livro Um balão na Europa, que além das aventuras pela Europa, relata suas experiências tentando levar os ciclistas candangos para novas trilhas no seu Rancho Cristaluna, fora do circuito pirenopolino.

Assim, fiquei muito feliz quando o Carlinhos, do grupo PSR, resolveu inovar, inventando uma nova trilha para Padre Bernardo, cidade goiana que, em linha reta, fica a oitenta quilômetros de Brasília. A trilha mapeada ficou com 120 km, saindo do Taguaparque.

Comecei os preparativos para a trilha na quinta-feira. Reforcei a alimentação, comendo religiosamente de duas em duas horas. No jantar de sexta-feira, macarrão para reforçar os estoques de glicogênio.

Acordei no sábado com uma hora de antecedência e tomei um café da manhã reforçado, com batata-doce e ovos cozidos. Quando fazia os últimos preparativos, um barulho começou do lado de fora de casa. Chuva forte. Sair de casa pedalando na chuva não é nada fácil. Continuei minha arrumação, até que às 5h15 parti. A chuva havia diminuído e agora não passava de um chuvisqueiro fraco. Segui sozinho pedalando até o Taguaparque, a oito quilômetros de casa. A maioria da turma já estava lá. O pelotão ficou assim: Carlinhos, João Campos, Timão, Magoo, André Pitta, Paulo Mendes, Fernando, Jocieudes, Reginaldo, Marcelo, Valmir, Josemilton, Toninho, Evaldo, Fabão, Ricardo, Alex, Vagner e eu.

Partimos pontualmente às 6h da manhã, como avisava previamente a programação da trilha: “Partida às 6h. Tolerância zero em respeito aos que chegam no horário.” Justíssimo!

Planejávamos passar pela Flona e depois pegar o single do Parna Brasília, mas como havia chovido, esses trechos estavam muito lisos. Preferimos seguir pelo asfalto da DF-001. Chegamos rápido à parte de terra desta rodovia, que segue margeando o parque. Nela furaram alguns pneus e também tivemos uma corrente quebrada, da bike do Toninho, que fez rapidamente o reparo.

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Seguimos pela DF-001 até seu entroncamento com a DF-170, na região do Lago Oeste. Ali esperamos os últimos ciclistas do pelotão chegarem.

Seguimos pela DF-170. Depois de subir mais um pouco, começamos a longa descida de quase quinze quilômetros até o Rio da Palma, local conhecido pelos ciclistas de Brasília como “Buracão do Google”.

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Logo depois passamos pela Mineração Rio do Sal e em seguida entramos na estrada para a Capela de São Sebastião. A partir daí, para mim, só terreno desconhecido. A cada curva, novas paisagens. Isso é o que me atrai no MTB.

Cruzamos o Rio do Sal. Ele estava bem cheio, com águas barrentas. Chovia na cabeceira.

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Alguns de nossos colegas foram atacados ao cruzar a ponte. Uma cobra coral atravessava a pista e deu-lhes bote. Felizmente, todos saíram ilesos, inclusive a cobrinha.

Numa curva da estrada, quase na metade do caminho, encontramos o nosso carro de apoio, apelidado de Carrega-Frouxo. Tinha muita cerveja, paçocas, bananas e água. Comi umas paçocas e voltei ao pedal. À nossa frente, muita subida. O paredão apareceu sem mandar recado. Hora de pôr à prova a super-nutrição dos últimos dias. Subi fácil. Funcionou!

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Adentramos numa região montanhosa, com muita mata e alguns riachos. Vales cheios de vegetação sempre apareciam na paisagem. As primeiras ladeiras foram as mais fortes. Verdadeiras paredes.

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Chegamos na Capela de São Sebastião. Bela paisagem, emoldurada pela serra coberta de mata.

Paramos para reagrupar. Quando a turma chegou, partimos novamente. O Ribeirão das Salinas, que normalmente não passa de um palmo de água, havia subido, mas passamos sem problemas.

Evaldo e eu estávamos mais rápidos. Fomos subindo e adentrando na mata que emoldurava a capela. Quando nos demos conta, nossos amigos haviam sumido. Esperamos no alto de uma ladeira por alguns minutos, mas nem sinal deles. Imaginei que haviam se juntado ao pelotão da cozinha e seguimos.

Uma estrada estreita, aparentando abandono, marcou esta passagem. Poças d’água eram os sinais da chuva que passou por ali.

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Saindo da mata, começaram a aparecer fazendas. Fomos discutindo como algumas pessoas moram em lugares tão isolados. Numa descida, dois cachorros saíram correndo de uma casa à beira da estrada e vieram ao nosso encontro. Um era bem grande, e escoltava um menor, que parecia o líder. Eles emparelharam ao meu lado, e eu acelerei rumo ao Córrego Água Amarela. Felizmente, a ponte era feita de largas tábuas, e passei rápido. Os cães pararam sobre a ponte e ficaram me observando. Seu território estava defendido. Deve ter sido um dos dias mais felizes da vida desses cães. Puderam correr atrás de dezoito ciclistas. O que mais sofreu foi o Valmir, que fugindo dos cães caiu da bike e quase foi mordido. Sua sorte foi que, ao cair, a bicicleta ficou entre ele e os cães, além da providencial chegada do Carlinhos, que espantou os cães no grito.

Chegamos na BR-080 por volta das 10h30. O Posto Pirâmide foi o local de parada para o lanche. Quando chegamos, a turma da dianteira estava saindo. Levaram consigo a chuva fina que caía. Enquanto Evaldo e eu lanchávamos, chegaram nossos amigos abandonados, e logo depois, João Campos. Sem GPS, pediram para eu lhes esperar.

Depois que todos lancharam, partimos. O pedal continuou pela BR-080 até um outro posto de gasolina, onde voltamos pra terra. O Carlinhos havia dito que dali pra frente “era só reta”. Mentira! Os primeiros quilômetros até foram planos, mas depois começou um sobe e desce sem fim. Quando chegamos numa lavoura de soja, não imaginávamos o que nos esperava pela frente. Na parte mais baixa da estrada, muita lama. Ela foi grudando nas rodas, entrando na corrente. Quando ouvi um barulho forte e o pedal travando, olhei pra baixo e o estrago estava feito. Meu câmbio entrou na roda e a gancheira quebrou. Empurrei alguns metros até sairmos da lama.

O barro era tanto que estava difícil até entender o que havia acontecido com a bike. Quando alguns sugeriram seguir até o próximo riacho, para poder limpar a bike, alguém olhou pra trás e exclamou: “Olha o que tem aqui atrás.” Era uma bica d’água, que caía dentro de um tonel de concreto. Pulamos a cerca, lavei a bike e comecei o reparo.

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Enquanto eu trocava a gancheira, Toninho percebeu que seu pneu havia furado. A turma entrou no tonel pra se refrescar.

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Em cerca de trinta minutos terminamos o serviço e voltamos pra trilha. O barro na estrada diminuiu, mas continuou por cerca de dez quilômetros.

A esperança de uma estrada plana até a cidade foi se perdendo conforme o tempo passava. Ela foi substituída pela realidade de um sobe e desce interminável de morros. Apesar de difícil, a paisagem compensava o sofrimento.

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A turma estava cansada. Na sombra de um pequizeiro, deitaram-se à sombra e colocaram as pernas para cima. Segundo João Campos, “estavam oxigenando as pernas”.

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O que nos preocupava nesse final de trilha era a água, que rareava em nossos reservatórios. Toninho já estava sem nada quando paramos na frente de uma casa. O dono nos avistou da janela e gritou oferecendo água. Providência divina! O Sr. Luiz, agora sitiante, foi morador de Taguatinga. Mudou-se para o sítio depois de se aposentar. Ele foi muito simpático e até nos pediu que lhe avisasse de nossa passagem da próxima vez, para ele providenciar-nos o almoço. Sr. Luiz nos forneceu várias garrafas de água geladinha.

O Rio dos Bois estava logo depois do sítio. Como todos os outros, estava sujo e volumoso. Seguimos em frente.

O asfalto da cidade apareceu quando eu já estava com 128 km. Dali até o posto de gasolina onde foi nosso ponto de encontro, completei 130 km de trilha.

Estava com muita fome quando cheguei no posto. Fui direto pro almoço, preparado na loja de conveniência. O proprietário abriu mais cedo especialmente para nos receber. Ficamos no posto até as 18h, quando partimos para Brasília. A viagem foi tranquila, mas chegando em Taguatinga, o Pistão Norte estava todo alagado. Havia chovido muito por ali. Desembarcamos as bikes no Taguaparque debaixo de chuva.

Parabéns ao Carlinhos, Timão e todos que participaram da organização dessa trilha. Ficou ótima.

10 comentários sobre “Taguaparque – Padre Bernardo – 18/03/2017

  1. Foi um pedalzão e tanto, sou um cara privilegiado em pedalar com esses parceiros brutos no pedal.
    Parabéns Evandro o relato ficou excelente, deu até vontade de voltar lá.
    Abço.

    Curtido por 1 pessoa

  2. Que relato Evandro, foi um excelente Pedal, todos completaram pedalando, sem nenhuma queda, foi perfeito
    DEUS foi generoso com todos,
    Foi superação e ótimo desafio aos PSRs

    Curtido por 1 pessoa

  3. Muito bacana o relato, parabén Evandro,, se eu soubesse q ia escrever tinha deixado o cachorro morder o Valmir para da mais emoção no relato…kkkkkk

    Curtido por 1 pessoa

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