Cicloviagem Litoral Norte-Paranaense – 20 a 25/07/2001

“Muita chuva, lama e calor humano nas cidades do litoral norte-paranaense.”

Londrina, 20 de julho de 2001

Depois de quase um mês de conversa, Dionísio e eu decidimos sair para mais uma expedição Pé na Trilha.

Primeiramente, pensamos em ir para o Rio de Janeiro, fazer a travessia Petrópolis – Teresópolis, mas nosso amigo de Niterói, o Andrei, não tinha disponibilidade para o final de semana que poderíamos ir. Resolvemos, então, visitar o litoral norte-paranaense. Comecei a trocar e-mails com o Fábio, um amigo de Curitiba, e, depois de muita conversa, decidimos o que fazer.

Seguiríamos de ônibus até Curitiba, pedalaríamos até Morretes e depois Antonina. Nesse primeiro dia de viagem, seguiríamos pela Estrada Velha da Graciosa, trecho original da Estrada da Graciosa, que entrou em desuso quando um trecho asfaltado foi construido até a BR-116. Depois, pegaríamos o trecho asfaltado da Estrada da Graciosa atual até Morretes. De Morretes seguiríamos até Antonina, onde passaríamos a noite. No segundo dia, pedalaríamos até Guaraqueçaba. Para o terceiro dia, ainda não tínhamos programação, mas havia várias possibilidades. O importante era que, na terça-feira, o quarto dia da aventura, pegaríamos o trem de Morretes a Curitiba.

Embarcamos no ônibus em Londrina às 23h59. Levava comigo minha bicicleta, uma barraca, um saco de dormir, uma mochila de 60 litros, lotada por roupas e outras tralhas, e a esperança de não passar muito frio, já que não havia espaço para muitas roupas quentes. Dionísio levava uma mochila menor que a minha, uma barraca um pouco maior e um saco de dormir que mais parecia um colchão.

O Dionísio passou em minha casa às 23h. Chegamos na rodoviária e descarregamos nossas bikes e bagagens. Não havia carrinho de bagagens para levar nossas coisas e tive que subir as escadarias da rodoviária para tentar encontrar algum. Encontrei um e desci a rampa para carregar as coisas. Depois de colocar tudo em cima do carrinho começamos a subir. O problema é que a rampa é muito estreita e nosso carrinho estava largo. Deu um trabalhão para subir, pois havia na rampa e o carrinho estava pesado.

Curitiba, 21 de julho de 2001

Chegamos à rodo-ferroviária de Curitiba um pouco antes das 6h da manhã. Depois de abastecer nossas caramanholas com a água mineral da geladeira do ônibus, descarregamos nossas bikes e, enquanto eu montava a minha bicicleta, o Dionísio foi ao banheiro colocar sua bermuda. Quando ele voltou, eu fui ao banheiro e ele ficou montando a sua bike. Quando voltei, um susto: percebi que tinha esquecido minha bolsa com o telefone celular e minha carteira no banheiro. O desespero bateu. Todo meu dinheiro estava lá, cartões e documentos. Voltei correndo ao banheiro. A pochete não estava lá. Saí correndo, perguntando a todos que encontrava se tinham encontrado a pochete. Fui ao sistema de som, ao achados e perdidos, à administração da rodoviária. Nada. Pensei até em desistir da viagem e voltar para casa. Foi aí que pensei em ligar para o meu celular que deveria estar com a pessoa que encontrou minhas coisas. Felizmente esta pessoa era de boa índole. Ele atendeu o telefone e ainda estava na rodoviária. Ele estava numa lanchonete. Fui correndo para lá. Encontrei-o e ele devolveu minhas coisas. Ufa! Que susto! Fortes emoções já no começo da aventura.

Com tudo em ordem novamente, pegamos a estrada.

Saímos pedalando pelas ruas de Curitiba, rumo à BR-116. Logo chegamos nela. O trecho da BR-116 que liga Curitiba a São Paulo é conhecida como “Rodovia da Morte”. Depois de alguns quilômetros, conseguimos encontrar uma padaria, em uma rua paralela, e paramos para tomar o café da manhã. Após o café, novamente na 116, seguimos até o Trevo do Atuba, onde começa a “Estrada Velha da Graciosa”.

Esta estrada era o caminho original da Estrada da Graciosa e deixou de ser usado quando um trecho foi construído ligando um ponto da estrada até a BR-116.

Esta estrada antiga passa em frente ao Parque de Exposições Castelo Branco, em São José dos Pinhais, segue até Quatro Barras, passando ao lado da Barragem do Iraí, que abastece com suas águas Curitiba e região, e termina em um trecho asfaltado da rodovia nova.

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Ela possui alguns trechos asfaltados e outros empedrados. Pode-se perceber alguns resquícios do calçamento original, de paralelepípedos. É uma bela trilha sempre cercada por Araucárias centenárias e pela mata atlântica.

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Em Quatro Barras paramos para pedir informações a um morador e ele contou-nos várias coisas. O homem falava muito. O Dionísio, que a esta altura já estava muito cansado, aproveitou para descansar. Tivemos que cortar a conversa para poder seguir viagem.

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Depois de pedalar por cinco horas seguidas paramos para almoçar ainda na Estrada Velha. Comemos os lanches que levamos.

Encontramos a Graciosa atual, com asfalto, às 13h. Havia muita neblina, garoava e fazia frio. Descemos a serra até Morretes sem nenhuma trégua da chuva. A chuva e a neblina nos impediram de admirar todas as belezas da Graciosa.

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Na descida da serra passamos por recantos muito especiais. O Recanto da Cascata é um dos mais belos com a cachoeira que desce do alto da serra. Um detalhe chama a atenção neste recanto: a grande quantidade de “macumbas”. Havia frutas, velas, pratos com comida e outros objetos usados nos rituais. Isso é muito triste pois as pessoas que praticam estes atos poluem a área com seus “trabalhos”. Há muitas placas na estrada tentando conscientizar essas pessoas, mas, aparentemente, não está surtindo efeito.

Há também outro recanto muito especial, onde existe um trecho do “Caminho Colonial da Graciosa”. Esse caminho colonial era usado para transportar mercadorias do litoral para o planalto, transporte feito no lombo de mulas.

A antiga ponte metálica sobre o Rio Nhundiaquara é um local muito visitado pelos turistas. O belíssimo rio de serra é usado para banho e para prática de bóia-cross. Em Morretes, pode-se alugar bóias para descer o rio.

É incrível como os freios de nossas bicicletas foram sacrificados durante a descida da serra. As pastilhas praticamente acabaram. Minha bike, que nunca foi boa de freio, deu muito trabalho. Os paralelepípedos molhados estavam muito escorregadios e eu tinha que fazer muita força para a bicicleta ir devagar. Cheguei embaixo da serra com os braços muito doloridos.

Às 16h30, depois de passar por São João da Graciosa, chegamos a Morretes. Como o Dionísio estava muito cansado, decidimos ficar na cidade. Por causa da chuva, procuramos um hotel em vez de ficarmos em um camping. Fomos a três hotéis e pousadas e todos disseram que estavam lotados. Achamos estranho pois não havia nenhum evento na cidade e estávamos na baixa temporada. Finalmente, no quarto hotel em que procuramos, o Porto Real Palace Hotel, conseguimos nos hospedar.

Rodamos neste primeiro dia de viagem cerca de 74 km.

Dionísio estava muito cansado. Depois do banho, tomou Tylenol e pegou no sono. Foi difícil acordá-lo para sair. Pensei que ele tinha desmaiado.

barreado.jpgÀ noite, para refazer nossas energias, comemos um autêntico Barreado no restaurante Terra Nossa, no centro de Morretes. O Barreado é um prato forte e exótico com carne, toucinho e temperos, e é acompanhado por banana e farinha de mandioca.

Morretes, 22 de julho de 2001

Decidimos seguir para Paranaguá, em vez de ir a Guaraqueçaba. Nossos planos mudaram devido ao mau tempo do primeiro dia que fez com que ficássemos em Morretes e não em Antonina como estava previsto.

Acordamos cedo, tomamos café no hotel, pegamos nossas coisas e fomos dar algumas voltas pela cidade. Compramos um pacote de balas de banana, uma especialidade da região, para dar energia para pedalarmos, e depois partimos para Paranaguá. Cerca de 50 km separam as duas cidades. Seguimos pela rodovia de pista simples até a BR-277. No caminho encontramos um carro que acabara de capotar.

Quando saímos de Morretes, estava garoando mas logo parou. Só tomamos chuva num trecho de 2 km na 277.

É incrível como o Brasil joga dinheiro fora pelas estradas que escoam a safra de cereais. A rodovia chega a cheirar mal com tanta soja e milho jogados pelo asfalto.

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É muito interessante prestar atenção às aves da mata. Canários-da-terra, gaviões, gralhas, periquitos, maritacas, quero-queros, socós e muitas outras espécies podem ser vistas nos arredores das estradas.

Continuamos pela estrada e chegamos em Paranaguá por volta do meio-dia. O Dionísio sugeriu que fôssemos primeiro ao centro e depois ao porto, pois ele ficava muito longe. Seguimos, então, pela avenida por onde entramos na cidade e, quando nos demos conta, já estávamos no porto. Já que chegamos ali, tentamos visitá-lo. Não foi possível pois o horário de visitação era a partir das 13h30. Seguimos para o centro histórico pois pretendíamos ir a Guaraqueçaba de barco.

Ao chegar ao centro, descobrimos que já havíamos perdido o barco. O próximo só na segunda-feira, às 13h.

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Então, almoçamos e procuramos uma pousada para nos hospedar. Desta vez a primeira pousada que visitamos nos aceitou. Na Pousada Tia Bela encontramos bom preço e conforto.

Devidamente instalados e alimentados voltamos ao porto e fizemos a visita. Os navios cargueiros são realmente grandes.

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De volta ao centro, passamos pela ponte sobre o Rio Itiberê, que leva até a Ilha dos Valadares.

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Foi às margens do Rio Itiberê que a cidade nasceu. A ponte é para pedestres, é estreita e não comporta tráfego de veículos (somente motos e bicicletas podem passar). A Ilha dos Valadares fica em frente a Paranaguá e é urbanizada. Caminhamos pelas ruas dessa comunidade até o outro lado da ilha, onde passa o Rio dos Correias, e depois voltamos para o continente. Fizemos uma rápida visita à Igreja Nossa Senhora do Rosário e voltamos à pousada.

À noite, fomos à feira que estava acontecendo em comemoração ao aniversário da cidade (29 de julho) para jantarmos.

Integram as comemorações vários eventos como Feira das Nações, Festival da Canção e de Teatro, exposição de pintura, shows musicais, lançamentos de livros de autores Paranaguaras e até uma feira de artesanato andina.

Nesta feira, conversamos com dois dos vendedores de artesanato, um peruano e um boliviano. Muito simpáticos, tivemos um ótimo bate-papo e até nos animamos para uma futura viagem para Machu Picchu. Apesar da vida sofrida, eles conhecem toda a América do Sul e boa parte da Central. Depois até comprei uma luva de lã de lhama para dar-lhes uma força.

Paranaguá, 23 de julho de 2001

Eu acordei um pouco tarde nesse dia e, enquanto o Dionísio tentava levantar-se, fui dar uma volta pela cidade. Visitei o mercado municipal e conversei com um pescador. Em Paranaguá, como na Pinheira/SC, tem festa da tainha. E este ano elas também não vieram em grande número para cá. Eles tiveram que comprar na região para abastecer a festa. Do mercado, caminhei novamente até a Ilha dos Valadares para ver o mangue de perto. Depois, fui até às igrejas de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito.

A Igreja de São Benedito, construída em 1784 por uma irmandade de escravos, é uma das melhores e mais autênticas edificações populares do colonial brasileiro. Foi tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1962.

A Igreja de Nossa Senhora do Rosário foi a primeira em solo paranaense e a primeira dedicada a Nossa Senhora do Rosário no Brasil. Construída no período de 1575-1578, sofreu sucessivas reformas, adaptações, saques e destruição das peças. A parte menos atingida pelas mutilações é a fachada, que ainda guarda intactos o seu esquadramento e aberturas. É a Catedral Diocesana, tendo sido tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná em 1967.

Um fato que marcou a história destas duas igrejas é que a Igreja de São Benedito era frequentada apenas pelos escravos, enquanto a de Nossa Senhora do Rosário era frequentada apenas pelos nobres.

Depois da visita às igrejas, voltei à pousada. O Dionísio já havia acordado. Arrumamos nossas coisas, fechamos a conta e nos despedimos das simpáticas recepcionistas. Almoçamos em um restaurante que fica de frente para o Rio Itiberê e fomos até o trapiche onde embarcamos para Guaraqueçaba às 13h.

passbarcoA viagem para Guaraqueçaba é muito agradável. O barco passa por uma das mais belas regiões do litoral paranaense. Saímos pelo Rio Itiberê em direção à Baía de Paranaguá. Passamos em frente ao porto e seguimos para a Ilha das Peças. É a primeira parada do barco.

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A região é muito rica em vegetação. Há muitas ilhas.

O que mais nos chamou a atenção na Ilha das Peças foram os botos. Havia vários em volta do barco.

Continuamos a viagem para Guaraqueçaba com chuva fraca e lá aportamos às 15h30. Desta vez, mesmo com chuva, acampamos. Armamos nossas barracas no Camping Chauá que, além de camping, também é uma pousada.

Depois fomos conhecer a cidade. É interessante a disposição das construções. Tem-se o trapiche, onde aportamos, uma praça e meia dúzia de lojas. Tudo isso espremido entre o Morro do Quitumbê e a Ponta do Morretes (que não tem nada a ver com a cidade de Morretes), onde várias pessoas estavam pescando. Há uma rua que sobe até a Igreja do Nosso Senhor Bom Jesus dos Perdões. A partir desta rua que leva até a igreja, há ruas que levam ao restante da cidade. Ao lado do trapiche também há uma estreita rua cercada de casas em estilo colonial. Aparentemente, uma das primeiras ruas abertas na cidade. Dá até para imaginar como ela era no início do povoamento da cidade: os colonizadores perambulando por ela, galinhas soltas ou presas em gaiolas, frutas e mantimentos espalhados, etc.

A Igreja de Nosso Senhor Bom Jesus dos Perdões foi construída em 1838. Em estilo colonial, com grossas paredes de pedra, foi a primeira construção de Guaraqueçaba. Em seu interior destaca-se o altar em forma de embarcação, cuja base é um peixe esculpido em madeira, uma homenagem dos pescadores da região.

Depois de andarmos pela cidade, fizemos a trilha de oitocentos metros que leva ao alto do Morro do Quitumbê e proporciona uma bela vista da Baía de Guaraqueçaba e da cidade. Voltamos do morro e fomos à Ponta do Morretes e lá estavam os botos novamente.

De volta ao camping e depois do banho, fomos lanchar. O carrinho de lanches ficava ao lado de um ginásio de esportes e pudemos assistir a duas partidas de futebol de salão: uma masculina e outra feminina. Depois do futebol ao vivo, fomos assistir ao fiasco da seleção brasileira de futebol pelas quartas de final da Copa América contra Honduras.

Depois ainda demos umas voltas pela cidade. Fomos ao trapiche e lá estavam os botos.

Apesar de esta viagem ter sido extremamente úmida, o calor humano no litoral nos chamou a atenção. A população nos tratou extremamente bem, a não ser em Morretes, onde tivemos a impressão de não sermos bem vindos (problema dos hotéis). O senhor de Quatro Barras que nos contou várias coisas, o senhor que nos fotografou na âncora em Paranaguá e nos falou de suas experiências como fotógrafo, ciclista e turista. O longo papo que batemos com o peruano e o boliviano na feira. Um guarda-florestal que conhecemos no barco indo para Guaraqueçaba. Um frentista de um posto de gasolina de Guaraqueçaba que também conhecemos no barco. As recepcionistas da pousada de Guaraqueçaba. Um curitibano chamado Paulo, que conhecemos em Guaraqueçaba e que nos convenceu a mudar o itinerário do último dia de viagem. A receptividade dos paranaenses do litoral nos deixa até orgulhosos. Às vezes a viagem vale mais pelas pessoas que conhecemos do que pelos locais visitados.

Depois de nossa conversa com o novo amigo curitibano, o Paulo, que conhecemos no camping, resolvemos mais uma vez mudar nosso roteiro mutante. É que não adiantaria subir para Curitiba de trem pois não veríamos nada além de neblina. Então, decidimos ficar em Guaraqueçaba até terça-feira e conhecer a Reserva Natural Salto Morato.

Guaraqueçaba, 24 de julho de 2001

Choveu a noite toda. Fiquei preocupado com a possibilidade de não podermos visitar o Salto Morato. De manhã ainda chovia. Depois de tomarmos café no restaurante do camping a chuva diminuiu.

Às 8h30m já estávamos pedalando. A trégua da chuva durou pouco. Depois de alguns minutos de pedalada ela voltou. A estrada de Guaraqueçaba é muito bonita. É cercada de mata dos dois lados em grande parte de seu percurso. Nos sentimos no cenário de filmes como “Platoon”, “Rambo II” e “Tudo Por Uma Esmeralda”: a estrada no meio da floresta, muita chuva e lama.

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De nossa roupa escorria barro que era lançado pelas rodas da bicicleta. Rodamos os dezoito quilômetros até o Rio Guaraqueçaba e mais dois quilômetros até o início da estrada da reserva. Esta estrada, que tem cinco quilômetros, é pedra pura, não dá nem pra ver terra ou areia no chão, só pedra. Apesar disso, é bem legal andar por ela. Não são pedras britadas, que são mais comuns nas estradas, são pedras de rio, arredondadas, por isso não atrapalham muito.

moratoChegando na reserva, pagamos a taxa de entrada na portaria (R$ 3,00) e seguimos até o centro de visitantes. Fomos recepcionados por duas simpáticas estudantes de biologia que estavam fazendo estágio. Geralmente os visitantes assistem a um vídeo sobre a reserva, mas, nesse dia, o centro de visitantes estava sendo usado para um curso de guarda-parque e não pudemos assistir ao vídeo. Elas nos mostraram as maquetes da reserva e alguns cartazes e bonecos sobre a fauna existente ali. No centro há também a calçada da fama dos bichos, com pegadas de vários animais gravadas em blocos de cimento (capivara, preá, mão-pelada, cotia, cateto, queixada, gambá, gato-do-mato, cachorro-do-mato, veado, anta, jaguatirica, furão, serelepe, lontra, tatu, ouriço, algumas aves, etc).

Depois da visita ao centro, fizemos a trilha até a maior atração da reserva: o Salto Morato.

A caminhada é leve e a trilha está bem definida, portanto não exige muito esforço. A primeira etapa é atravessar uma curiosa ponte pênsil, com cerca de 40 m de comprimento, sobre o Rio Morato. Cerca de quatrocentos metros após a ponte pênsil, chega-se ao aquário natural, onde é permitido mergulhar entre os peixes, que num primeiro momento se assustam com a presença humana, mas depois se aproximam. Um dos planos dos administradores da reserva é colocar snorkels à disposição dos turistas.

Do aquário até o Salto Morato são seiscentos metros de trilha. Várias flores típicas da Floresta Atlântica dão um colorido à paisagem, que quase não recebe a luz do sol de tão densa. Em seguida encontra-se o Salto Morato, com sua queda de 130 m (medidos em 99 por Waldemar Niclevicz). Alguns dizem que a cachoeira tem 80 metros. Para chegar lá é preciso passar por algumas pedras. Entre elas há pequenos lagos com peixes variados. Não é permitido chegar próximo à queda, pois as pedras são escorregadias e também podem rolar.

Ficamos contemplando o salto por alguns minutos e fizemos o caminho de volta até o centro de visitantes. Nos despedimos das meninas e voltamos para a estrada. Às 13h estávamos pedalando. Deveríamos chegar em Guaraqueçaba até as 15h pois pegaríamos o ônibus para Curitiba às 17h e ainda não havíamos desmontado o acampamento.

A chuva, que deu um tempo enquanto visitávamos o salto, voltou logo e com força.

Aproximadamente no meio da estrada da reserva, quando passávamos em frente a uma casa, dois cachorros que estavam brigando resolveram correr para a estrada e, por incrível que pareça, o Dionísio foi atropelado pelo cachorro!!! O animal (cão) saiu em disparada do quintal da casa e não percebeu que estávamos passando. Ele bateu na roda da frente da bike do Dionísio e o derrubou. Eu não sabia se ria, ajudava o Dionísio a levantar ou ajudava o cachorro. Além disso, a dona do cão ficou resmungando e chingando. Até agora eu não sei se a mulher estava chingando a gente ou o cachorro dela. Porém, entre mortos e feridos, salvaram-se todos. Refeitos do susto, sem maiores danos à saúde dos envolvidos e sem problemas com a bicicleta, retomamos nosso caminho (e o cachorro seguiu o seu).

Nesse ponto da viagem, nossas bikes já não eram mais as mesmas. Sofriam com as intempéries climáticas. A minha estava com o guidão travando e certas vezes não virava. O câmbio também não funcionavam como antes. A do Dionísio fazia barulhos estranhos no movimento central e no eixo traseiro. Felizmente elas aguentaram e chegamos pedalando em Guaraqueçaba.

Logo que saímos da estrada da reserva ainda testemunhamos a concretização de um dito popular: uma vaca atolada na lama e alguns vaqueiros tentando tirá-la. Desta vez, literalmente, “a vaca foi pro brejo”.

A estrada de Guaraqueçaba nos fascinou. Ela é muito bonita. Riachos de água cristalina cruzam a estrada em vários pontos. Há muita vegetação. Num dia de sol deve ser muito bom pedalar por ali.

Chegamos em Guaraqueçaba às 14h30. Foram 25 km de trilha. Desmontamos as barracas, lavamos as bicicletas que estavam cobertas de lama, tomamos banho, pagamos nossa conta no camping e fomos para a rodoviária. É a Viação Graciosa que faz a linha. Nos cobraram R$ 13,00 por cada bike (foi a única vez nesta viagem que pagamos para transportá-las) e R$ 13,96 por cada passagem até Curitiba.  

O ônibus percorre 96 km, passando por várias localidades, como Serra Negra, dentro do município de Guaraqueçaba, até chegar em Antonina, a cidade portuária que estava nos nossos planos iniciais da viagem. Depois, passa por Morretes e vai até a BR-277, por onde segue para Curitiba.

Chegamos na Capital do Paraná às 22h30, e aguardamos até as 23h59 quando o ônibus para Londrina sairia. O ônibus encostou na plataforma e ficamos esperando até que os outros passageiros embarcassem. Quando fomos colocar nossas bicicletas no bagageiro, o motorista não queria as levar. Disse que não caberia, que deveria estar embalada, etc. Mas, com um pouquinho de conversa, tudo deu certo. Ele pediu que colocássemos as bikes no fundo do ônibus, com muito cuidado pois, como não estavam embaladas, poderiam rasgar a bagagem de alguém. Então, o Dionísio entrou no bagageiro com muito cuidado e delicadamente ajeitou as bicicletas. Bem, na realidade, foi diferente: ele entrou no bagageiro pisando nas malas e jogou as bicicletas de qualquer jeito lá no meio.

Londrina, 25 de julho de 2001

Chegamos em Londrina às 6h. Terminamos a viagem com uma última pedalada até nossas casas.

Apesar da chuva, da lama e dos sustos, a pior parte de uma viagem é quando ela termina. Fica a saudade dos novos amigos e a vontade de um dia voltar aos lugares visitados. Fica na memória a lembrança de um povo extremamente hospitaleiro que nos tratou como velhos amigos.

Mas nem tudo é ruim no final de uma viagem: o calor da família consola toda saudade.

AGRADECIMENTOS A:

– Fábio Henrique Meurer Wasilewski <fabiow@tre-pr.gov.br>, que nos ajudou a preparar o roteiro da viagem.

– Paulo Segalla <segalla@hotmail.com>, que nos deu boas dicas sobre Guaraqueçaba e nos convenceu a mudar o roteiro do último dia.

– Todas as pessoas que conhecemos pelo caminho.

O Barreado

Disputa-se em Morretes não apenas um lugar nos restaurantes para comer o Barreado, mas também a paternidade deste típico prato paranaense, que tem causado acirradas discussões entre Morretes, Antonina e Paranaguá.

Os antoninenses, que possuem a mais forte tradição carnavalesca do Paraná, tendem a associar o Barreado ao “Entrudo”, o precursor português do nosso carnaval. Depois da folia, o Barreado era servido para “forrar” o estômago. Já os morretenses tendem a aproximar a origem do Barreado com sua cidade dizendo que os tropeiros, durante o ciclo da erva-mate, traziam do planalto, quando desciam o Caminho da Graciosa, um cozido bem temperado que durava muitos dias sem que se deteriorasse.

Outros dizem que o Barreado incorporou-se à culinária cabocla também pelos tropeiros, que subiam e desciam o litoral pelos caminhos das serras e que, no final da tarde, quando acampavam para o pernoite, faziam uma forte refeição. Explicam que o louro é utilizado como tempero em função das suas propriedades digestivas, já que o Barreado é um prato “pesado”. Afirma-se também que, no passado, o Barreado era levado a um braseiro e permanecia por 24 horas no fogo, até “ficar no ponto”.

De um jeito ou de outro, todos concordam que a cachaça sempre acompanhou, e deve continuar acompanhando, o Barreado. Símbolo de fartura, de festa e alegria, o nome do prato vem da expressão “barrear a panela”, que é vedar com pirão de farinha de mandioca e cinza a tampa da panela, para não se perder a fervura. Outros dizem que a origem do termo está ligada ao utensílio de barro utilizado para fazer o cozido.

Hoje, o Barreado ultrapassou as fronteiras culturais e a disputa de sua origem para se tornar o mais típico prato do litoral paranaense.

Receita do Barreado

Ingredientes (Para 10 pessoas)

  • 5 Kg de carne fresca (peito, cochão mole, patinho)
  • 500 gramas de toucinho fresco
  • 5 tomates sem pele
  • 3 cabeças grandes de cebola
  • 3 dentes de alho
  • 4 folhas de louro
  • 6 pitadas de cominho
  • 6 pitadas de pimenta do reino
  • 4 maços de cheiro-verde
  • 1 maço de alfavaca
  • 1/2 litro de vinagre
  • Sal a gosto

Preparo

Começa-se o corte e a limpeza das carnes de véspera. As carnes e o toucinho devem ser cortados em pedaços pequenos, adicionando-se todos os temperos cortados. Leva-se tudo à uma vasilha que não seja de alumínio. Deixa-se repousar até o dia do preparo. Forra-se a panela com o toucinho e leva-se ao fogo para derreter. Depois põe-se as carnes temperadas, tampa-se a panela com uma folha de bananeira previamente sapecada na chapa para amolecer, amarra-se com um barbante grosso nas bordas. Coloca-se a tampa e barrea-se com uma mistura de cinza de fogão, farinha de mandioca e água fervendo, para dar a liga. Depois de bem vedada, leva-se ao fogo forte nas primeiras horas, passando-se para um fogo mais brando depois. O fogão tem que ser a lenha. O tempo de cozimento é de 12 horas. Quando a folha de bananeira estiver bem escura, está pronto o Barreado.

Modo de Servir

Serve-se com farinha de mandioca, banana, laranja e arroz. Amasse uma banana no prato e misture com farinha de mandioca e Barreado. Acompanha uma bebida alcoólica (batida ou pinga) que serve para rebater este prato, considerado forte.

Fonte: Secretaria de Turismo do Paraná

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