Brasília, 20 de março de 2021.
https://www.strava.com/activities/4983672687
O Rio Maranhão nasce em Goiás, bem próximo à divisa norte do Distrito Federal. Lá existe um emaranhado de morros íngremes com vales profundos chamado Serras do Maranhão. O local é de difícil acesso, os morros são cobertos de campos nativos e cerrado e os vales tem belas matas de galeria. Impróprio para a agricultura extensiva, o que se vê na região são fazendas de gado e pequenas roças. Foi essa dureza que criou refúgio para os animais que tiveram seu habitat invadido pelos humanos. O projeto “Brasília é o Bicho” costuma armar suas câmeras nessa rica região e vem registrando cenas incríveis de animais selvagens como onças pintadas, suçuaranas, lobos-guará, tamanduás, etc.
Essas terras franzidas abrigam as mais belas trilhas de Brasília e do Entorno. É por lá que estão a delirante Alto Delírio e a pesada Casa de Pedra e Ônibus Fantasma, ambas fechadas ao público. A primeira foi fechada devido a mudanças na posse de uma fazenda: o antigo dono morreu e os herdeiros não quiseram mais ver ciclistas passando por suas terras. Já no caso da Casa de Pedra, os culpados pelo fechamento foram nós mesmos. Sim, nós ciclistas. Deixamos tanto lixo na fazenda que o proprietário resolveu proibir o acesso. Sacolas plásticas, garrafas de gatorade, sachês de gel. Lixo! Eu até tento entender a cabeça de quem joga lixo nas trilhas, mas não consigo. Só posso imaginar que seja falta de educação, literalmente, ou seja, ninguém ensinou ao sujeito que descartar lixo em local inadequado é errado. Mas até nesse caso (de não ter recebido educação de seus genitores), a pessoa inteligente e observadora perceberia que aquilo não é bom, ela notaria a degradação do local visitado devido ao seu lixo e mudaria de atitude, mas, pelo jeito, também falta inteligência a muitos de nossos colegas ciclistas. Ou será que eles gostam de pedalar no meio do lixo?
Caso você se sinta inspirado a conhecer esta trilha que relato aqui, por favor, não jogue lixo pelo caminho. Recolha tudo e descarte em local apropriado. Os fazendeiros, a natureza e a comunidade pedalante agradecem.
Enfim, foi nesse rincão abençoado que fui pedalar neste final de semana. O ponto de partida da trilha foi a Pedreira do Moxé, na DF-205. Lediane e eu seguimos de carro até o local, onde chegamos por volta das 7 horas da manhã. Quando chegamos, um outro grupo já estava se preparando para sair e fazer a mesma trilha. Um deles veio falar comigo. Era o amigo Hércules, o qual não via há muito tempo, e continuei não vendo, pois ele estava de máscara. Essa pandemia! 😖
Logo chegaram Sidcley, Rodolfo, Eldenice, Gilson e Wilson. Partimos às 7h30.

Seguimos pela DF-205 por três quilômetros, até entrar na estrada de terra que leva ao Rio Maranhão. Ainda no asfalto encontramos um jibóia morta.

Como choveu muito na véspera, havia lama na estrada, mas nada que dificultasse nossa passagem.

A estrada até o Maranhão é praticamente só descida. A ponte foi reformada e agora tem guardrails. Leidiane, ao passar sobre a ponte, enroscou-se nas tábuas longitudinais e quase leva um tombo.
Depois da ponte, começa a sofrência. São 2,5 quilômetros até o local mais alto, com 234 metros de ascensão e inclinação média de 9%. Devido à alta umidade, quando começamos a subir havia neblina, mas ela dissipou-se conforme o sol foi esquentando.

Apesar da dureza da subida, é bom levantar a cabeça e apreciar a paisagem. À direita tem um vale lindíssimo. Curta o visual!
No alto, passamos por um colchete e começamos a descer rumo ao Córrego Mangabeira. A estrada está bem ruim, cheia de valas. É bom descer com cuidado. Rodolfo tomou um belo tombo aí. Quase no final da descida, há um Chevrolet Caravan abandonado no meio da mata da baixada.
A carcaça é um ponto marcante da trilha, local da foto oficial.

Mais um pouco de descida e cruzamos um córrego, escalamos pequena ladeira escorregadia e chegamos numa igrejinha ao lado da estrada. Descemos mais um pouco, e finalmente cruzamos o Mangabeira por ponte.
Logo depois da ponte, começamos a subir. Placa indica “Fazenda Palmital” e foi para onde seguimos. Não tínhamos percorrido nem duzentos metros quando ouvi uns estalos assutadores, som de corrente quebrando. 😖 Olhei para trás e lá estava o Sid encostando a bike no barranco. Sid passou cinco anos sem pedalar e agora está tentando retornar à atividade. Até agora tinha pedalado apenas no asfalto. A velha corrente, corroída, apesar de aparentemente boa, não aguentou a pressão e rompeu-se em dois lugares.

Sid fez o reparo, mas quando voltamos a girar, a corrente quebrou novamente. Não teve jeito, ele voltou dali. Enquanto isso, a turma ficou esperando na próxima curva.
Continuamos subindo, ladeira desgastante apesar de curta. Desde a ponte, foram 1.800 metros de distância até o ponto mais alto, 10% de inclinação média. Comprei terreno numa área erodida: a bike enroscou na vala e não consegui desclipar a sapatilha. Esperei a turma no alto, enquanto apreciava a vista.
Mais 500 metros e chegamos na porteira de uma fazenda. Passamos por um colchete à esquerda e cruzamos o trecho mais bonito dessa trilha. A estrada segue por uma estradinha erodida sobre o divisor de águas dos córregos Água Fria e Mangabeira. Ao norte, onde está o Água Fria, grande morro alto proporciona vista muito bonita. Passe com calma, pare nos lugares mais altos e contemple a paisagem.
São apenas 1.300 metros por essa cumeeira. No final, entramos numa estrada estrada e entre sobes e desces, voltamos ao Córrego Mangabeira.
À nossa frente, os morros no horizonte anunciavam o que nos esperava para sair daquele “fundão”.

A trilha Fundão forma um “oito” nessa parte principal, por isso retornamos ao Córrego Mangabeira.
Fiquei um pouco para trás com Leidiane. Quando chegamos à ponte do Mangabeira, os amigos que tinha levado pouca água estavam enchendo suas caramanholas no riacho. A água não estava muito bonita, mas era o que tinha naquele local. Leidiane e eu ficamos em cima da ponte. Enquanto eu tirava água do joelho, ao lado da cabeceira da ponte, olhei para uma árvore próxima, a cerca de dois metros de mim, e vi algo preto enrolado nos galhos. Pensei que era uma câmara de ar jogada por algum ciclista e não dei muita atenção. Mas quando olhei novamente, vi que não era uma câmara de ar.
Era uma caninana (Spilotes pullatus), cobra que tem fama de ser nervosa e de correr atrás de quem a incomoda, mas, na verdade, é uma cobra mansa que geralmente foge quando percebe a proximidade de humanos. Ela não é peçonhenta e alimenta-se de roedores e cobras menores. Sua cor é predominantemente preta e tem manchas amarelas que formam belos desenhos geométricos. É uma cobra muito bonita. Acredito que ela tinha cerca de dois metros de comprimento e ficou imóvel enquanto estivemos por lá.
Deixamos a caninana tomando sol e seguimos nosso caminho morro acima. Foi a pior subida do dia: 3,5 quilômetros com inclinação média de 8%. Pegamos esse trecho por volta de 11h30 e o sol castigou. Leidiane começou a brigar comigo nessa subida, dizendo que é uma trilha muito difícil para ela. Mas subiu tudinho sem empurrar a bicicleta. Realmente, “Pedalar cansa, mas sofá mata!” 😉

Completamos o “oito” quando chegamos na parte mais alta da trilha, no local em que, na ida, passamos por um colchete. A partir daí é o mesmo caminho para voltar à pedreira.
E uma vez no alto, descer até o Rio Maranhão foi muito fácil. Cruzamos a ponte e seguimos pela estrada. Até passamos por um rebanho de vacas pastando nas laterais da estrada, mas, dessa vez, elas não nos incomodaram.
Terminamos a trilha às 12h30. Sidcley, que pelo jeito teve que empurrar muito a sua bike, chegou na pedreira ao meio-dia. Pedalamos 33 quilômetros com 1.170 metros de subida.
Foi uma satisfação participar dessa aventura com amigos especiais, lugar de natureza exuberante, trilhas difíceis mas que a beleza supera as dificuldades, valeu estou ansioso pela próxima.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Show amigo !!! Estes relatos são quase um filme !!! Valeu !!!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Foi mesmo uma trilha bem difícil, como nos velhos tempos de Pedaguas! Mas apesar da dificuldade, a companhia de amigos queridos e a paisagem belíssima compensa o sacrifício. E como você bem disse, “Trilha cansa, mas sofá mata”. Então, bora pedalar!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Evandro e seus relatos sempre ricos e apaixonantes. Felizmente surgiu essa trilha como alternativa para a região depois que ficamos órfãos da Casa de Pedra e Ônibus Fantasma. Muito legal acompanhar cada momento em seus textos, amigo! Que Deus o abençoe muito!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Bom demais voltar a pedalar e rever os amigos. Acho que bike estava desacostumada… Kkkk.
Da próxima, prometo ir até o final.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Massa, Evandro desbravador! Trazendo para o mundo os segredos dos nossos rincões desconhecidos. E o Sid maltratando a corrente. Vai voltar a ser aquilo, outra vez! 🙂
CurtirCurtido por 1 pessoa
Excelente Evandro! da próxima quero ser convidado, em!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Trilha top. Já estive lá. Muito difícil….. pretendo voltar não. Rssss
CurtirCurtido por 1 pessoa
Pingback: Trilha Cristal Elite – 27/03/2021 | Ser Pedalante